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Publicado em 30 de Novembro de -1

Comissão da Verdade recebe 1º relato de tortura fora da ditadura

O empresário Boris Tabacof demorou 60 anos para revelar as violações por que passou ao ser preso, por motivos políticos, em 1952.


Comissão da Verdade recebe 1º relato de tortura fora da ditadura

Fonte: Diário Comércio Indústria & Serviços
 
O empresário Boris Tabacof demorou 60 anos para revelar as violações por que passou ao ser preso, por motivos políticos, em 1952. O depoimento é o primeiro tomado pela Comissão Nacional da Verdade de uma vítima de violação de direitos humanos fora do período da ditadura militar (1964-1985).
"Me obrigaram a tirar a roupa e a ficar nu durante vários dias e a única coisa que tinha nesse cubículo era um balde para as necessidades e esse balde não era retirado. Então, tinha que dormir no chão e, de vez em quando, chegava um soldado e jogava água", contou, em depoimento prestado à Comissão Nacional da Verdade em novembro de 2012.
O empresário é único que falou que está dentro do período da comissão, mas que não foi torturado na ditadura, foi no governo Getúlio Vargas
Maria Rita Kehl
membro da CNV
Hoje com 84 anos, Tabacof era à época membro do Partido Comunista e dava suporte a militantes que atuavam dentro das Forças Armadas. "Fui secretário de organização do Comitê do PCB na Bahia, o segundo cargo do partido no estado. É aí que entra como eu tenho a ver com todo esse movimento, que foi um movimento dentro da esfera militar", explica o empresário que fornecia material ideológico para os militares comunistas. "Eu só tinha contato com uma pessoa, um cabo do Exército cujo nome de guerra era Plínio".
Em 20 de outubro de 1952, Tabacof foi preso dentro de um ônibus. "Foram bofetadas de todo jeito e me arrancaram do ônibus, me colocaram em uma caminhonete que foi direto para o Forte do Barbalho [em Salvador]", conta. No local, começou o período de 400 dias de prisão ao qual foi submetido. Segundo o empresário, as grades das celas do forte eram cobertas com tábuas, "para ninguém ver o que estava acontecendo".
"[O empresário é] o único que falou que está dentro do período da comissão [de 1946 a 1988], mas que não foi torturado na ditadura, foi no governo Getúlio Vargas [de 1951 a 1954 ]", ressaltou a psicanalista Maria Rita Kehl, um dos membros da comissão presentes ao depoimento de Tabacof.
Além dele, foram presos na operação para desmantelar a infiltração comunista nas Forças Armadas mais um civil e 28 militares. De acordo com o empresário, os agentes do governo de Getúlio queriam provar que havia um complô comunista simpático à União Soviética para assumir o poder no Brasil.
"Como eu não estava contando nada que eles queriam, nem queria assinar, eles foram piorando as coisas. Eu fiquei alguns dias de pé com um soldado, de baioneta calada, ao meu lado que não deixava que eu me sentasse", lembra sobre o período de cárcere que também incluiu 50 dias de isolamento em uma penitenciária em Sergipe.
Ao final, o empresário acabou assinando uma confissão, junto com os demais presos. Ele respondeu a processo até julho de 1954, quando foi solto após o julgamento.